Grandes empresas estão apostando em uma nova estratégia
para estimular a troca de conhecimento entre gerações e atrair e reter talentos
mais jovens: a mentoria reversa -profissionais menos experientes se tornam
mentores de outros mais seniores.
"A prática começou a ser impulsionada em 1999 quando
Jack Welch, então presidente da General Eletric, pediu que executivos de alto
escalão da empresa procurassem mentores mais novos para ensiná-los a usar a
internet", diz a coach Eva Hirsch.
A especialista afirma que o movimento no Brasil ainda é
modesto, mas que há espaço para crescimento.
A empresa de comunicação Burson-Marsteller iniciou neste
ano um programa de mentoria reversa: profissionais mais jovens, da área de
comunicação digital, têm ajudado gerentes de outros setores.
"Com o crescimento da prática digital, houve a
necessidade de consultar pessoas que tinham mais habilidade na área. E são os
profissionais mais jovens, que já nasceram na era on-line", explica Patrícia
Ávila, 49, vice-presidente de operações da empresa.
Amanda Allegrini, 22, é uma das mentoras reversas do
programa. Ela afirma que se sente mais valorizada por isso. "Ver
profissionais da liderança, que têm posições estratégicas na companhia, me pedindo
opinião, me deixa mais motivada", diz.
Para Carlos Eduardo Pereira, sócio da consultoria de RH
Top Quality, essa é uma das principais vantagens da prática. "De alguma
forma, todo mundo é carente e busca protagonismo. Mais que dinheiro, as pessoas
querem sentir que o que pensam e falam é levado em consideração."
A empresa de bens de consumo P&G também usou a
mentoria reversa. Os funcionários da área de tecnologia se tornaram mentores
dos gestores da organização para deixá-los mais eficientes com ferramentas
digitais.
O venezuelano Simon Gamboa, 30, foi transferido para o
Brasil à época e se tornou orientador da diretora de comunicação da empresa. A
ideia era fazer encontros mensais para tirar dúvidas.
Ele afirma que o bom relacionamento entre mentor e
mentorado é essencial para que o projeto dê certo. "É ótimo estar perto da
liderança de um jeito diferente, em que seu gestor não te parece intocável. Mas
é importante ter afinidade com a pessoa. Não basta só conhecer o tema."
Para Pereira, é importante que esse tipo de troca de
conhecimento entre gerações esteja na cultura da empresa. "O ideal é que o
programa seja bem explicado e que a companhia já tenha equipes mistas. Dessa
forma, diminuem os riscos de antagonismo."
Esse antagonismo pode partir dos dois lados: os mais
velhos podem não se sentir à vontade para pedir ajuda para os mais jovens, e os
mais jovens podem se tornar arrogantes ao quebrar o paradigma da hierarquia.
"Pode ser algo complicado para os gestores. Eles
estão acostumados a deterem o conhecimento e precisam ter humildade para
assumir que não dominam algo e precisam de ajuda", explica Rodrigo Adissi,
sócio da recrutadora MSA Recursos Humanos.
No caso dos mais jovens, Hirsch afirma que eles precisam
ser preparados para saber lidar com a hierarquia. "Na maioria das vezes, a
arrogância tem a ver com insegurança. A geração Y foi acostumada a falar de
igual para igual com os pais. Temos que tomar cuidado com o que achamos que é
arrogante."
Ela afirma que a prática é interessante para estimular a
empatia entre os profissionais. "Quando há a troca de papeis, você aprende
a se colocar no lugar do outro."
MENTORIA EXTERNA
O Citibank, em parceria com o 99jobs, realizou um
programa de mentoria reversa com os jovens que participaram do Summer Job da
empresa: durante um mês, universitários passaram por diversas áreas do banco e,
ao final, fizeram uma apresentação com ideias e sugestões sobre os produtos da empresa
e a organização.
Para Eduardo Migliano, sócio fundador do 99jobs, o
programa foi importante para que os profissionais mais experientes do banco
tivessem contato com a geração mais nova, que está entrando no mercado de
trabalho agora. "É interessante vê-los ouvirem de um estagiário que o modo
como eles se vestem os distancia dos funcionários mais novos", explica.
Para André Salgado, 39, gestor da área de segurança de
informação do banco, o resultado foi positivo. "Foi interessante ver as
opiniões que a geração mais nova tem sobre um dos segmentos mais tradicionais
do mercado."
Ele afirma que, por ter em sua equipe profissionais mais
jovens e mais velhos, tenta estimular a troca de conhecimento. "Enquanto
os mais experientes são mais analíticos, os mais jovens executam mais rápido",
diz.
Miguel Longuini, 21, que participou do programa como universitário,
afirma que a receptividade dos gestores animou os jovens. "Às vezes você
tem profissionais muito experientes, mas que não estão adaptados aos movimentos
que estão acontecendo. As coisas mudam rápido, nossa geração já nasceu sabendo
disso."
Por Bárbara Libório
Folha de S. Paulo
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